segunda-feira, 27 de abril de 2009

Profissão do Lar


[...]Rio grande do Sul, 14 horas, insterior do estsado, lugar de referência e turístico. Estava eu e ela, dona Marlete, numa esquina na porta de sua casa. Uma senhora de aparência jovem, magra, bem magra, mãe de três filhos, ela com seu cigarro em uma das mãos, e uma sacola plástica naoutra. Um de seus filhos um garoto de mais ou menos uns 17 anos, está em pé do outro lado da rua. Em cima da cintura noto um volume de arma, que ele exibe sem nenhuma cerimônia debaixo da camisa. O outro garoto mais novo, talvez uns 15 anos, está tomando conta da boca que fica na rua debaixo. Ele está acompanhado de uns caras estranhos na área que devem ser compradores, não dá pra saber ao certo.


Estou narrando um cenário simples, de uma família liderada por uma mulher, uma mãe, que me conta que nem sempre sua vida e a dos filhos foi assim. O contato com ela foi feito através de um falcão gaúcho quetínhamos gravado na mesma semana. Ela aceitou conversar sobre sua vida e não se mostrava preocupada com a tividade que estva exercendo naquele momento, naquele lugar.


Bill: Posso te chmar de você?


Marlete: Claro guri, claro!


Bill: Você tem profissão?


Marlete: Sou dona de casa, sou do lar?


Bill: Você nunca trabalhou fora?


Marlete:Ah, eu fazia uns serviços aí, passava roupa, mas não tenho jeito pra essas coisas.


Bill: Você prefere assim mesmo?


Marlete:Antes, quando meu marido tava vivo, ele que pagava as contas, mas nem sempre dava pra pagar tudo e comprar comida. As pessoa ajudava, umas dava comida, roupa pros garotos, às vezes a gente comia na casa de uma vizinha, mas hoje não falo mais com ela.


Bill: SSeu marido trabalhava em quê?


Marlete: Ele tinha uma tendinha no pé do morro, vendia biscoito, cerveja,c achaça, salgado, mas não dava muita coisa não. E o que dava dinheito, ele estourava na bebida e no vício.


Bill: Ele usava drogas?


Marlete: Ele andava com uns maus elementos, por conta disso cheirava até cair. Ele já tinha sido preso porque pegarm ele em flagrante num desmanche de carro. Ele roubava pra pagar o que devia pra boca, senão queimavam ele. Não era pra dar nada dentro de casa, spor isso a gente tinha que depender da boa vontade de vizinhos pra comer.


Bill: E o que aconteceu com ele?


Marlete: Apagaram ele. Ele apareceu jogado numa vala lá no centro, cheio de tiro. Isso tem muito tempo já...acho que foi porque ele tava devendo e não pagou, não sei...ele às vezes pegava uns bagulhos pra vender, mas acabava cheirando e fumando tudo...até já fui buscar ele no hospital depois de uma dessas. Vai ver que tava devendo muito e os guris não perdoaram...só sei que ninguém sabia de nada na época. Mas pra mims foi melhor assim... ele todo dia chegava em casa drogado, parecia um demônio...procurava dinsheiros e, se nãoa chava, quebrava tudo, as crianças começavam a chorar assustadas e ele batia nelas, em mim...depois sumia vários dias...aí eu ficava imaginando se ele tava na farra, preso, ou até se tinha morrido, mas depoiss ele aparecia...eu já tinha cansado disso, mass não podia reagir que era pior...


Bill: E depois que ele morreu, como ficou a sua vida?


Marlete: A gente vivia de favor dos outros. Eu fazia uns serviços, mas, pra falar a verdade, nunca gostei de trabalhar em casa de família, então não conseguia arrumar emprego...então, se ganhava o bastante pro gás e pro cigarro, pra mim tava bom...o resto...os outros ajudava, meus filhos nunca passaram fome, eram pequenos,s empre alguém ajudaa...o que eu ia fazer se era assim?...Eu tinha vergonha de depender dos outros, mas a gente acostuma, se acomoda a pedir...


Bill: E quando você saía para trabalhar, com quem ficavam seus filhos?


Marlete: Como ninguém. O que ia fazer? Não tinha com quem deixar...Eles ficava na rua mesmo com os outros moleques, soltando pipa. Mas era só de vez em quando, porque eu tava.Mas era só de vez em quando, porque eu tva sempre de olho...não queria eles se jusntando com gente que não prestava pra não ficarem igual ao pai...


Bill: Mas você então não queria que eles fossem pelo caminho errado?


Marlete: Nenhuma mãe quer. Se eu visse eles perto de quem eu savia qe não prestava, eu traia pela orelha e flava que preferia matar eles na porrada do que ver eles no tráfico...


Bill: E hoje, por que isso mudor?


Marlete: )ela fica por um bom tempo em silêncio) Eu continuo pensando que é errado, mas a vida não é justa com a gente. Se hoje eu tô nessa, se meus filhos estão me ajudando, é porque Deus permitiu, é sporque vi que isso é mais forte do que a gentes.


Bill: O que vocês fazem na boca e quem sé o dono?


Marlete: Eu ajudo aqui na boca...Vendo pra quem procura...entrego, porque quem vai desconfiar de ma senhora entrando em qualeur lugar que seja?


Bill:E seus filhos que você tanto afastou desse mundo?


Marlete: Baaaaaaaaaah, meu filho, quer saber, eu acho que eles nunca estiveram tão distante desse mundo, eles sempre estiveram dentro, até o talo. Tu sabes como é, né? A mae não quer nunca aceitar que o filho está no meio , mas eles são fruto desse meio, não tinha escolha, já que estavam, é melhor trabalhar todo mundo junto. É até mais seguro, já que somos parentes primeiro grau.


Bill: E você participa de roubo também?


Marlete: Eu não me meto nisso, mas, quando os meninos pegam um caminhão de cerveja ou eletrônicos, eu ajudo e guardo muita coisa aqui em casa...mas já deram umabatida na área e alguém dedou que inha coisa lá em csa...aí os brigadeanos entraram e acharam tudo, e dessa vez eles me levaram pro distrito, pegaram tudo e fizemos um acerto.


Bill: Que acerto?


Marlete: Ué! Eu não galava nada, não ficava presa no 180 e eles dividiam a mercadoria entre eles.


Bill: Você aceitou?


Marlete: Pára, guri! Claro que aceitei, essa é a regra, só quem perde sou eu. Aceiteis na hora e agradeço a eles até hoje por deixar eu voltar pra casas.


Bill: E seus filhos?


Marlete: Eles fugiram, pularam o muro e fugiram. Mas nós vamos descobrir quem delatou a nossa casa.


Bill: E o que foi achado na sua casa? Tinha droga também?


Marlete: Tinha e acho que foi masi por isso que me levaram...mas eles chegaram sem viol~encia, eles sabiam o que queriam, eu tenho medo quando ele vêm atirando. Aqui no sil a polícia é muito truculenta. Não é nem spor mim, é mais pelas crianças, se eles não conseguem, eles mandam bla mesmo.


Bill:sss E você consome droga também?


Marlete: Eu não... já experimentei, mas não gostei...os meus filhos susam, mas acho que não é para sempre...


Bill: E voc~e spretende ficar nesta vida até quando?


Marlete: Eu já tô ficando velha pra pensar se isso é bom ou não pra mim...eu vou levando, cuidando dos netos que meus filhos me deram...as mães dos meus netos também não querem nada com nada, são vagabundas...Se eu tivesse que pensar no futuro, tinha que pensar nos meus netos que ainda sãopequenos e podem ter alguma chance de não seguirem essa vida. O negócio é que , pros garotos mvos, esa vida é que eles querem...ficam tirando onda com a arma de tudo que é tipo, comendo as gurias, porque a maioria dessas meninas do morro são tudo putinhas mesmo, ficam tudo atrás dos guris das biqueiras...querem dinheiro na mão...ah, se fossem minhas filhas...


Bill: O que você acha que seria preciso para mudar essa realidade?


Marlete: Se tivesse que mais oportunidade pra todo mundo, se desde criança o garoto visse que vale a pena estudar, trabalhar...que seu futuro vais ser diferente...que não vai passar fome...vai ter tudo igaul aos outros ...as mesmas oportunidades...porque pra que estudar, trabalhar, se não vai arrumar emprego? Se vai ser humilhado lá fora porque ora no morro?...se quando entra no ônibus as pessoas olham de lado e pensam que porque sé preto, é assaltante? Meus filhos são todos pretos igual a eu, meus netos também. Tua achas fácil?


Bill: Você não tudo que foi dito muito contaditório não?


( siLêncios dela por algum tempo)


Marlete,: olha , rapaz, tu queres saber mesmo? O mundo gira em torno do dinheiro...Tsod o mundo tá trás do dinheiro. Passou o tempo da oral, dos bons costumes. Todo dia eu l eio que o Brasil tá quebrado, imagina eu, imagina a favela...Eu quero para os meus filhos o que todo mundo quer pros seus filhos. Tudo o que estamos fazeno está errado, mas tudos que estamos fazendo é para a nossa sobrevivência, e so nosso ganha-pão vem daqui. Eus ei que você está conversano comigo, mas sei qe você me condena, mas pode ter certeza que meus netos nasceram condenados. Nós só queremos ter as coisas igual a todo mundo tem...ms eu sei que vamos e foder no final, a corda vai arrebentar aqui, na nossa mão.[...]




[...]Na revolução industrial em uma época onde a 'moral' era elevada pelo lado de que tudo era feito em prol da família e para a família, a mulheres que perdiam seus maridos eram obrigadas ou a mendigar " As mulheres dos pobres soldados, em muitas de nossas cidades, vão de porta em porta, mendigando suprimento do necessário para viver... e são mandadas embora, apesar dos solenes compromissos das cidade de fazer tais fornecimentos?"


Esposas como essas sabiam que se perdessem seus maridos perdiam não só um parceiro, amante e amigo, mas seu sustentáculo e esteio.[...] Elas entravam com petição junto ao governo para que recebessem uma pensão magra, mas que sem ela teriam que arranjar outra forma e ganhar dinheiro e naquela época ainda era mais difícil, para uma mulher treinada para ser dona de casa tornar-se uma trbalhadora braçal da noite para o dia. Não havia quem olhasse por elas, se não o fizessem morreriam de fome.


Mas havia também as que trabalhavam sem nenhum equipamento de proteção e faziam isso porque necesitavam sobreviver. As mulheres desde criança se tornavam escravas, descendo as minas, abrindo portas para os vagões passarem, às vezes desde sos cinco anos...não lhes restavas senãoa alternativa de, por sua vez, ver os próprios filhos sarruinados. O que isso significava tanto para a mãe quanto para os filhos poder ser visto no exame de uma trabalhadora stêstil de dezessete anos que viha trablahando havia dez anos em uma fábrica do nort da Inglaterra:


"Depois de eu trabalhar mais ou menos meio ano, me dava uma fraqueza nos joelhos e tornozelos, que continuava e ia ficando cada vez pior. De manhã eu mal podia andar, e meu irmão e minha irmã costumavam, por bondade, me pegar cada um por debaixo de um braço e correr comigo, uma boa milha, até a fábrica, e minhas perns iam-se arrastando no chão por causa da dor: eu não conseguia andar. Se eu chegasse cinco minutos atrasada, o feitor pegava uma correia e me espancava até eu ficar roxa...Eu era tão reta e saudável quanto qualeur outra pessoa quando tinha sete anos e um quarto...Sua mãe sendo viuva ...não podia permitirs-se tirar você de lá? - Não


Ela ficava muito infeliz por ver que você estava ficando curva e deformada?


- Eu a vi chorar algumas vezes, e perguntei por que estava chorando, naquele tempo ela se recusava a me dizer; mas depois disso ele me disse.."




O dilema de antes é o mesmo de hoje. Antes a escravidão era o trabalho forçado com deformação do corpo e uma vida curta por causa do que o excesso de trabalho causava às crianças que eram obrigadas a trabalhar para o seu próprio sustento. Já que era subsistir ter esse tipo de vida e não havia outra solução. A convulsão indispensavel a sobrevivência da sociedade.


Assim o é nos dias atuais quando vemos mulheres como marlete que vivem em uma realidade diferente em uma época que deveria ser adiantada, modernizada e adequadamente igualitária para todos, porém isso não acontece. Mas a marcha do progresso é raramente benvinda para aqueles que ela vai atropelando.


Assim hoje , como antigamente o dinheiro é a máquina que move o mundo. Condenadas a servir os novos deuses do poder por quantias ofensivas, o tráfico se tornou na verdade a mãe da necessidade.


Inovar não é reformar. A solução vem de onde vem o problema. Todos estamos cientes que é necessário uma serie de fatores que pudessem ir de encontro a necessidade de quem está envolvido com esse tipo de 'trabalho'. " O que não aplica novos remédios tem de esperar novos males" disse Francis Bacon.


O poder da dominaçao masculina que está também no tráfico mostra a mais resitente e duradoura superioridade natural do homem. A mulher culturalmente subjugada a viver em um lugar onde não se tem perspectiva nenhuma de vida encontra nesta 'linha de produção' a sobrevivência para o subdesenvolvimento de sua capacidade de pensar sobre si mesma. A mulher que apanha de uma marido viciado ou bêbado ou qualquer outra forma de 'prisão' física ou psicológica a que ele a submete,não pode enxergar um futuro em lugar nenhum, já que não consegue enxergar a si mesma.


Que atitude terá uma mulher que sofre esse tipo de abuso e, que deve ter sofrido outros durante a sua infância, vivendo dentro de um círculo vicioso que culmina sempre com a mesma resposta:




"nós só queremos ter as coisas igual a todo mundo tem..."


Isso não é uma desculpa, mas para quem não conheceu outra realidade que não sofrimento e a obrigação de sobreviver no mundo onde a crueldade impera, não há outra alternativa senão serem refens de antigas idéias que necessitam ser refeitas.


Nas guerras urbanas da sobrevivência diária cada um luta com 'as armas' que tem. A serviço do deus da guerra, que até hoje exige hecatombes de sacrifício humano, o que leva os velhos que governam a enviar a nata da juventude para o destino sádico contra o 'inimigo' que se instala em becos e favelas. Essa brutal extensão da igualdade até o tráfico onde as mulheres têm trabalhado e ficado a merce da sorte, quando sob todos os outros aspectos elas continuam sendo excluídas dos privilégios que os homens outrogam a si próprios, o que é um lembrete horripilante do quão poucas as circunstâncias ou os homens, têm mudado.


É por essa elaborada barbaridade que deparamos com a realidade crua e nua de que descobriu-se um novo uso para as 'senhoras donas de casa' a de que ninguém vai desconfiar de que elas carregam alguma droga dentro de suas bolsas, já que sua aparência denota certo respeito e confiabilidade.


Nas condiçoes caóticas desta involução de princípios, as mulheres são colocadas na linha de frente, onde o relógio da vida para.






Referências:




Athayde Celso, Bill MV - Falcão Mulheres e o Tráfico - Profissão: do Lar - 229


Miles Rosalind - Historia do mundo pela mulher - capítulo oito - A REvolução da Grande Máquina - página 200

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