Termina a longa espera da jovem
afegã Aisha Mohammadzai. Ela sonha com um novo rosto há três anos,
desde que teve o nariz e as orelhas mutilados pelo marido, após uma tentativa de
fuga do casamento forçado. Os longos cabelos negros disfarçam bem um dos
problemas, mas para o outro, bem no centro da face de sorriso simpático, não há
muita saída - e é isso o que mais a incomoda. "Se eu tivesse meu nariz, teria
uma vida normal", disse ela, em entrevista à rede americana CNN, poucas semanas
antes de receber a notícia de que seu processo de reconstrução facial, enfim,
teria início. No fim da semana passada, Aisha deu entrada no Centro Médico
Walter Reed National Military, em Maryland, nos Estados Unidos. Depois de
aproximadamente seis horas, a primeira de seis cirurgias - que serão feitas ao
longo de pelo menos dois anos - está completa.
Uma semana antes do grande dia, sua nova família (um casal de imigrantes
afegãos) se sentou com a jovem para saber como ela se sentia. "Não estou com
medo. Estou feliz", disse, sorrindo. "Sofri muito na minha vida. Agora, sinto
que uma luz vem em minha direção." O caminho que Aisha ainda tem a percorrer,
porém, é tortuoso. No curso das várias cirurgias, ela terá de lidar com grande
dor e desconforto, além da incerteza de que o resultado final fique perfeito.
Por isso, precisou esperar tanto. Não era considerada psicologicamente preparada
para enfrentar o invasivo processo cirúrgico. Logo que chegou aos EUA, em 2010,
a afegã ganhou uma prótese temporária da Fundação The Grossman Burn, para usar
até que pudesse iniciar a reconstrução. Mas ela surpreendeu a todos quando se
recusou a utilizar o nariz artificial, preferindo estampar a deformação do rosto
como uma bandeira a denunciar, por exemplo, as violações dos direitos das
mulheres no seu país (veja outros casos no final Aisha foi prometida em casamento quando tinha apenas
12 anos - prática comum no Afeganistão.
Para colocar fim a uma dívida de seu pai,
o noivo era um militante do Talibã. Aos 16, ela foi mandada
para morar com a família do futuro marido, que estava
em combate no Paquistão. Desde o início, já sofria
maus-tratos extremos nas mãos dos sogros e cunhados
. Ao tentar fugir de casa, foi entregue de volta ao marido
pelo próprio pai, para que recebesse o castigo "merecido":
a mutilação do nariz e das orelhas com uma faca.
Por mais impressionante que possa soar, esse também
é um costume difundido por todo o país, e a maioria das
vítimas acaba sofrendo no anonimato. O caso de Aisha
foi um dos poucos a ganhar repercussão internacional]
, quando, aos 18 anos, ela estampou o rosto
deformado na capa da edição de agosto
de 2010 da revista Time (reprodução ao lado).
da reportagem).
Personalidade - A preocupação com o estado emocional de Aisha é plausível. A psicóloga Shiphra, que a conheceu em 2011, descreve a personalidade forte da jovem: "Por um lado, ela era uma adolescente comum, com muita energia, que gostava de chamar a atenção dos outros. Era adorável e educada. Por outro lado, tinha sérios problemas de comportamento, que se revelaram durante o tratamento". Segundo ela, muitas vezes era difícil lidar com ela, que tinha dificuldade de contar detalhes de sua vida, especialmente de toda a situação que envolvia o pai, o sogro e o marido. "Embora seu pai não tenha sido exatamente um modelo para Aisha, ela ainda falava muito sobre ele e ficava triste quando ficavam muito tempo sem contato", conta. A jovem não demonstrava raiva extrema, mas ficava visivelmente alterada ao falar sobre o quão terrível o Talibã era para as mulheres no Afeganistão. "Ela queria vingança", diz Shiphra. "O objetivo da terapia era fado.zê-la não pensar muito sobre o passado, e olhar adiante."
Mas até quando ela pensa no futuro, fica clara a influência de seu passado nas decisões: a menina quer ser policial. Casar-se de novo? Ela até pensa, mas não é prioridade na sua vida - assim como ter filhos. "É um jeito interessante de ver o assunto, pois em sua cultura se casar é uma das coisas mais importantes do mundo", lembra Shiphra. E quem tenta se aproximar de Aisha precisa ter paciência para transpor a timidez e a desconfiança, conforme aponta Esther: "Vai demorar um pouco para que ela reaprenda a confiar. A desconfiança está intrínseca a ela agora, muito profundamente. E quem desconfia tende a rejeitar as pessoas antes de ser rejeitada, ou machucar antes de ser machucada. É uma reação normal de adaptação para quem passou por um trauma desses". Trauma esse que Aisha divide com muitas conterrâneas. A comissão independente afegã dos direitos humanos contabilizou 1.026 casos de violência contra as mulheres somente no segundo trimestre do ano passa
Fonte: http://veja.abril.com.br/noticia/internacional/afega-mutilada-por-marido-comeca-a-recompor-o-rosto
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